quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

Vou me aposentar, e agora?

 
“A vida me ensinou a dizer adeus às pessoas que amo, sem tirá-las do meu coração”. Chaplin
Depois de quase uma vida dedicada ao Tribunal de Justiça, tendo passado por experiências diversas e enriquecedoras com atendimento a infratores, acompanhamento de abandonos e adoções, pareceres em disputas em varas de família e por fim, no atendimento clinico ao servidor do Poder Judiciário, meu tempo foi cumprido. Um misto de orgulho por ter dado os melhores anos de minha capacidade laboral e ao mesmo tempo uma certa tristeza por não ter mais a garra e a determinação que tinha aos 22 anos quando comecei para continuar no serviço público, uma vez que continuo no meu trabalho como autônoma em consultório privado.
A aposentadoria se configura para alguns como um período de lazer ou, como tem acontecido no Brasil, um retorno ao trabalho como necessidade de complementação da renda e do padrão de vida conquistado.
Fiquei me perguntando o que sentem as pessoas que estão prestes a se aposentar? O que pensam, o que desejam e como podem continuar ativas sem se sentirem desamparadas?
Sabemos que as realidades variam, mas de forma geral, aquele aposentado que dispõe de economias tem sempre mais liberdade para sonhar, encontrar um lugar no seio da família que muitas vezes depende dele financeiramente e isso lhe fornece a segurança para enfrentar novos desafios: tais como, se envolver num grupo de trabalho voluntário, abrir um novo negócio, realizar uma viagem e até mesmo retornar a uma atividade de estudo ou de trabalho mais prazerosa, sem ter de cumprir “metas”.
Nossa sociedade capitalista é tremendamente contraditória:
·     Por um lado considera a aposentadoria como um direito e uma conquista do trabalhador, depois de muitos esforços e anos de trabalho;
·     Por outro, desvaloriza o sujeito depois de aposentado, que passa a ser visto como improdutivo e, portanto, inútil.
Melhor exemplo disso se pode verificar nas empresas que não agradecem ao funcionário que passou quase uma vida dedicando-se ao trabalho: não existe uma solenidade como a da POSSE, nem uma carta de agradecimento tal quando se recebe uma carta de aprovação de um concurso, nem um exame médico/psicológico como o exame admissional para devolver o funcionário em plenas condições de viver sua aposentadoria com conforto físico e psicológico... Nada, simplesmente o funcionário passa de um dia para o outro a não fazer parte daquela “família”, com quem passou a maior parte de sua história, deixando muitas vezes filhos com febre em casa, abrindo mão de momentos decisivos na própria família e faltando a eventos importantes para ser um funcionário responsável!
Em entrevistas que realizei com colegas recém-aposentados as respostas sobre o que sentem é como se fossem uma laranja que não tem mais sumo...Como se de um dia para o outro não fosse mais um ser humano com emoções e sentimentos.
Pensando em tudo isso e vivendo agora na “pele” meu ultimo mês de trabalho, é que pensei como é importante um Programa de Preparação para Aposentadoria. Não somente oferecer, como já é de praxe em algumas empresas, palestras sobre:
·     Mudança na forma de estruturar o tempo depois da aposentadoria;
·     Mudança nos modos de se relacionar com familiares, colegas, subordinados, superiores; vizinhos e outros;
·     As implicações legais, biológicas, psicológicas, sociais, familiares que surgirão e como atender às demandas;
·     A importância e a forma de se buscarem alternativas de uso de suas capacidades e talentos.
Mas, acima de tudo penso que seria interessante e muito justo acrescentar:
I) Exame médico e psicológico nos últimos meses da aposentadoria para não iniciar um processo depressivo, pela baixa estima que a aposentadoria produz;
II) Orientação por pessoa competente, de planilhas de orçamento doméstico, uma vez que as perdas salariais vão fazer parte do seu futuro.
III) Orientação do psicólogo e assistente social aos membros da família, que devem ser ouvidos e convidados a participar da palestra que aborde o processo de aposentadoria e a importância do apoio do grupo familiar no momento de mudança de vida;
        Assim como, o  funcionário poderia receber uma carta de agradecimento pelos serviços prestados, a partir de informações de sua ficha funcional – existem funcionários que nunca tiveram uma falta ao trabalho e saíram sem um bilhete de agradecimento!
Ou mesmo constar no seu ultimo contra-cheque um desejo de feliz descanso.
São reflexões que faço numa visão psicanalítica, mas desejando que a Gerencia de Pessoas reflita sobre o desengajamento sucessivo do trabalho, com a ajuda de psicólogos e assistentes sociais sugerindo medidas, como por exemplo:
No último mês o servidor possa se matricular numa atividade física, curso de línguas ou  comece um trabalho alternativo e possa vir ao trabalho apenas duas ou três vezes na semana, visando uma separação gradativa e uma substituição desse lugar no qual fez seus amigos e poder ir deixando aos poucos o cotidiano de uma vida.
Como já dizia o poeta Mario Quintana: “Se me esqueceres, só uma coisa, esquece-me bem devagarinho”.

         Aracaju, dezembro de 2012

5 comentários:

  1. Maravilhosa reflexão... e que sejam especiais e felizes os dias a serem vividos após a longa jornada laboral.

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  2. Este comentário foi removido pelo autor.

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  3. Muito profunda e belíssima mensagem... e que o seu descanso seja repleto de alegria e saúde. Felicidades!

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  4. Excelente matéria. Vc escreveu exatamente o que penso, e estou pesquisando, pois estou prestes a me aposentar.
    bjs
    Sandra
    www.projetandopessoas.com.br

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